sexta-feira, janeiro 16, 2009


Respiro o último cigarro e escuto
o golpe desferido pelo vento bruto
que me alegra a alma pelo sadismo
com que tortura a pobre máquina, rainha do consumismo

É lindo sentir a felicidade
de ouvir um automóvel a implorar piedade
pelo pecado que comete, apenas por existir
O seu grito é desespero... dá-me vontade de rir

No entanto, este júbilo cruel é fugaz
é inevitável a sua metamorfose em sorriso da memória
da noite, em que o vento me deu a ver aquilo de que é capaz

Ainda assim, choro de angústia ao pensar
no ápice de humilhação sofrido pelo motor.
Não pela sua aflição, mas por tão depressa se esgotar a sua dor

João Zarco


Debaixo do Bulcão poezine
Número 1,5 - Almada, Janeiro 1997

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