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domingo, outubro 03, 2010

Construção


Esculpi
na pedra bruta,
o meu sentir e a minha alma.
Por entre as colunas do templo,
voam os meus afectos e sentimentos.

Lentamente, mas segura da razão
a obra nasce em consciência...

Caminho de olhos bem abertos,
a obra nasce em consciência...

Caminho de olhos bem abertos,
apoiado um bordão de acácia
em direcção ao Supremo.
De cabeça erguida,
enfrento ventos e silêncios.

Tudo é perfeito...
o aroma das rosas aguça-me.
No céu, entre astros
realça a estrela d'Alva.

A essência e o profano
transporta o astro-rei.
A obra floresce, a pedra está polida.


Artur Vaz


Debaixo do Bulcão poezine
Número 38 - Almada, Setembro 2010

quarta-feira, julho 21, 2010

ALEXANDRE HERCULANO – 200 ANOS APÓS O SEU NASCIMENTO



Passados dois séculos após o nascimento de Alexandre Herculano, é de facto uma grande lacuna não ter sido organizada nenhuma iniciativa à efeméride no âmbito nacional e oficial.

Surpreendente? Nem por isso. Em ano de centenário da implantação da república, dificilmente não sobraria ao Estado dinheiro e ideias para homenagear um homem que foi “apenas” um dos nossos mais elevados vultos e um combatente – em palavras e em armas – pela liberdade, pelo progresso, e pela corporização do civismo e da ética numa época.

Além de ser um grande historiador, Herculano fez poesia, teatro, romance, e ensaios. Atento ao seu tempo, foi também um acérrimo combatente pela liberdade. Denunciou as misérias e a corrupção. Foi um liberal sempre coerente e corajoso, com uma dimensão ética rara no seu tempo (século XIX).

Enquanto intelectual foi o portador dessa mudança, envolvendo-se na educação das novas gerações em instituições filantrópicas e em sociedades filomáticas, visando uma valiosa transmissão de saberes, sedimentando a mentalidade dos jovens para o novo ideal liberal, constitucional e democrático, em profunda contradição com a sociedade burguesa, que sufragava os mais desprotegidos.

E é aqui precisamente que pode estar a causa do desinteresse por este centenário por parte de quem tem a responsabilidade de gerir a nossa Cultura, pois a sua amnésia, coloca na penumbra do esquecimento figuras tão importantes da nossa memória colectiva e ícones de nossa identidade.

Toda a sua vida foi marcada por lutas políticas e pela reconstrução literária da história de Portugal. Alexandre Herculano foi dos mais importantes e notáveis escribas do nosso panorama literário. A sua escrita é envolvente de um cunho romântico e que se esteira desde a poesia, ao drama, à novela e ao romance.

É justo que se reconheça que foi um dos grandes escritores da sua geração, desenvolvendo o romantismo por excelência e a incompatibilidade do indivíduo com o meio social que o rodeia – ou seja alguém que se singularizou como um português de horizontes largos, um historiador probo e moderno, fiel às provas e à ciência, fundador da historiografia contemporânea, um cidadão comprometido à causa liberal e exemplar.

Escritor de perfil clássico, foi dos mais dotados no manejo da língua e uma enorme figura moral – homem de um só parecer; de um só rosto; de uma só fé; de antes quebrar que torcer.
Em suma, Alexandre Herculano é um símbolo forte do seu tempo. Uma vida dedicada à causa pública numa sociedade em permanente mudança, com todas as consequências sociais e pessoais que daí pudessem advir.

Digamos que o escritor sempre se manteve fiel ao seu espírito; o da procura de uma síntese fecunda entre a tradição e a modernidade, com um empenhamento intenso pela reforma do país, de modo a combater o atraso e todas as formas de intolerância.

É importante que à falta de valores que afecta a nossa sociedade, se ponha fim a um notório silêncio propositado – a todos os níveis – e que sejam divulgados às gerações vindouras a sua rara e ímpar consistência moral.

Alexandre Herculano e outros escritores têm sido tratados de um modo injusto o que certamente não aconteceria num país civilizado, onde os homens do passado são referência primordial para a construção de um futuro.

A ausência de importantes autores do nosso património literário no Plano Nacional de Leitura faz com que decorra o fracasso do nosso próprio sistema de ensino, incentivando, acima de tudo, os alunos para um determinado tipo de leitura que vise essencialmente o conhecimento da nossa própria identidade.

De facto, Alexandre Herculano foi um grande construtor de cultura pública por ter sido mais que um escritor e uma personalidade com grande intervenção no espaço público tendo como pressuposto «o objectivo de construir uma nova cultura para o país». Vertical nas suas atitudes, Herculano rejeitou honrarias: a pasta de Ministro; a Comenda de Torre e Espada e outros títulos. Atento à política da época, o historiador entende que «a Liberdade deve ser defendida por instituições históricas credíveis».

Toda a sua obra é constituída de um pertinente realismo, face ao momento de crise em que se vive no seu tempo, mas tão actual no momento presente.

Hoje, passados tantos anos, não se pode deixar Herculano e outros grandes vultos da nossa história guardados no biombo do tempo, onde a sedimentação do pó sarcástico da memória envolvem as suas vidas e a preciosidade das suas obras literárias.

Consciente da ingratidão e do realismo da alma lusitana, Alexandre Herculano que faleceu a 13 de Setembro de 1877, merece mais do que simples manifestações despercebidas, as quais em nada servem para enaltecer o valor intrínseco da sua intervenção cultural, cívica e social.



Artur Vaz

Artigo publicado no semanário Sem Mais Jornal
de 10 de Julho de 2010

quinta-feira, janeiro 07, 2010

Álvaro Valente o Homem e a Obra: novo livro de Artur Vaz

Com lançamento marcado para 31 de Janeiro, Artur Vaz vai lançar a biografia de Álvaro Valente, personalidade interventora na vida cívica montijense, nomeadamente na primeira metade do século XX, numa edição da Câmara Municipal do Montijo.
Farmacêutico de profissão, republicano de ideário político, Álvaro Valente distinguiu-se, também, como fluente orador. Maior notabilidade local e nacional alcançou a partir da década 30 do século XX, quando se entrosou com a causa dos bombeiros voluntários, primeiro na Associação Humanitária dos Bombeiros Voluntários do Montijo, de que foi comandante (a partir de Janeiro de 1931), depois, ampliando a sua intervenção no aparecimento da Liga dos Bombeiros Portugueses.

É dele a autoria do lema Vida Por Vida, hoje o ex-líbris do ideário de todos os “soldados da paz”.

Este trabalho histórico, para além de preservar a memória colectiva do Montijo, entronca também pedaços e factos inéditos da história local de Pinhal Novo, Estremoz e outros lugares como: Almada, onde encetou várias palestras, sendo ainda autor do poema do seu hino municipal, musicalizado pelo célebre maestro Leonel Duarte Ferreira e da obra poética em onze cantos Um Hino a Almada, raridade bibliográfica.

Tem prefácio do professor universitário e historiador Dr. Luís Graça, que diz a dado passo: “um diligente trabalho de pesquisa, sobretudo a nível da documentação provante, escorado em adequada bibliografia e honesta exposição. Mais uma obra para a galeria da bibliografia montijense, a reforçar os valores de uma identidade local, pois o seu autor é um investigador prestigiado pelos trabalhos a que mete ombros, fundamentais para o entendimento das origens destas terras da margem sul do Tejo”.

quinta-feira, abril 09, 2009

Sobrevivência



Dá-me a tua mão e vem
não tenhas medo
porque eu levo-te ao bem,
levo-te p'ro caminho da esperança
não é aquilo que não tens.
Dou-te coragem p'ra lutar
contra os teus rivais,
o calor dos meus beijos
a fortaleza dos meus braços
e outras coisas mais.

Não vivas na ignorância
que essa vida te quer dar
não deixes que o desânimo
se apodere de ti,
dá-me a tua mão e vem:
não tenhas medo de mim.

Não queiras morrer à míngua
nem que o teu corpo apodreça
no vácuo do Ser.
Levanta-te, segue o meu caminho
e verás que mais tarde
hás-de vencer.


Poema de Artur Vaz
ilustração de Henry Mourato

(publicado pela primeira vez em Jornal de Almada,
16 de Maio de 1970)

Debaixo do Bulcão poezine
Número 35 - Almada, Março 2009

segunda-feira, janeiro 26, 2009

PREITO A UM POETA…

a Fernando Barão


Nada é mais certo,
que só o tempo
poderá assolar
a tua argamassa.

Só o futuro será juiz…

Deixa mourejar
o teu ímpeto desafiar os meus braços,
dar força à centelha que me alumia,
rasgando o desvão
dos meus versos.

O teu retrato é este!

Sulcos de memórias e vivências, por ti partilhadas.
Jovialidade e clareza
que embaraça o temporão.
Distância que só tu sabes encurtar.

Só o futuro será juiz, todos nós sabemos…

Mas amigo!
as aves continuarão
a desafiar clarins de liberdade.
E nesta caminhada, que é a Vida,
a tua voz será sempre,
enquanto os poetas quiserem,
uma alfinetada no silêncio,
vestida de palavras, sob palavras.

Só assim, se enraíza um poeta…


Artur Vaz

In: Caderno Index Poesis n.º 73
de Janeiro de 2009 – Poemas para um Amigo

sexta-feira, janeiro 23, 2009

Sebastião da Gama


Servo de Deus,
poeta da natureza.
Tu serás sempre
anjo ancorado
na Serra-Mãe.

Terra que tu beijaste
e que por ti foi cantada,
nos poemas que deixaste
na obra inacabada.

Tu serás sempre uma voz
do Amor e da Liberdade,
na tua nova morada.
Poeta da natureza
da Távola, por ti criada.

Foste o arauto
e a voz da Arrábida,
Campo Aberto e Cabo da Boa esperança.
Pelo sonho, tu seguiste
entre estevas e flores,
num supremo querer divino
em férteis e encantados amores.

Foste Mar-Azul
memorial do teu povo,
êxtase e presença espiritual.
Tantas vezes te chamaram louco,
deixa lá isso!
Em tua defesa...estão os teus cânticos.
Os poetas, esses nunca morrem,
enquanto houver poesia, serão imortais.

Porque tu, Sebastião da Gama,
nesta encruzilhada da Vida,
foste e serás,
como Camões, Bocage e Pessoa,
um poeta genial.


Artur Vaz

Poema publicado com o consentimento do autor. A propósito da exposição "15 Artistas em homenagem a Sebastião da Gama", patente entre 24 de Janeiro e 7 de Fevereiro de 2009, na Biblioteca Municipal de Palmela. (Pintura, de Ana Maria Godinho, no catálogo da exposição)

terça-feira, abril 01, 2008

Mário Viegas - um caixeiro-viajante de poemas


«Profundo estudioso da nossa poesia, Mário Viegas foi, nos seus programas 'Peço a Palavra', 'Palavras Ditas' e 'Palavras Vivas', uma voz activa na divulgação dos nossos poetas mais representativos.

Candidato às eleições presidenciais em 1993, foi-lhe atribuído no ano seguinte por Mário Soares, então Presidente da República, o título de Comendador da Ordem do Infante.

Defensor intransigente da intimidade humana, viria a falecer no dia 1 de Abril de 1996, perdendo-se um actor de raro quilate.

Passados doze anos sobre a sua morte, Mário Viegas continua bem vivo na memória dos portugueses como 'a referência da mentalidade mais avançada em Portugal, em termos de humor'.»


Crónica de Artur Vaz, no blog Almada Cultural por extenso:


(publicada originalmente no jornal Notícias da Zona )


Mais sobre Mário Viegas:


quinta-feira, março 20, 2008

Artur Vaz escreve sobre Alexandre Castanheira:


«Tanto antes como depois da Liberdade, Alexandre Castanheira tem liderado vários movimentos sociais e culturais, desempenhando um papel preponderante a favor do progresso e da transformação humana, valores que se fundem na mesma alma e num só corpo.
Não se escondeu nas trincheiras de uma clandestinidade aburguesada, mas sim na luta com os operários, sem nunca abdicar da sua capacidade de intervir. O caminho era as suas ideias e por isso não se deixou Outrar.
Assumindo com coragem e determinação esta sua memória, guardiã do travo de tristezas e mágoas de um abandono forçado, por amar a Liberdade.
OUTRAR-SE ou a longa invenção de mim é, irreversivelmente, a sua própria tatuagem. Um livro inquestionável na sua vasta bibliografia, pela narração densa envolvida num impressionante realismo perturbador, ao ponto de o lermos num sopro.
Alertando como foi penoso alcançar a Democracia, o autor continua persistente na necessidade de arregaçar as mangas, para não deixar que a primavera de esperança que os cravos de Abril floriu, dê lugar à resignação e à vil tristeza de um povo sem ambição.»

Texto completo, em Almada Cultural (por extenso) , aqui


segunda-feira, fevereiro 18, 2008

Artur Vaz escreve sobre o Arquivo Histórico de Almada...

... no blogue Almada Cultural por extenso


«Uma das mais graves carências nas bibliotecas das escolas do nosso ensino básico e secundário é a não existência de um espaço destinado às obras de cariz local, importante fonte de cultura e saber.
Ora é a pensar nessa vertente que estas exposições do Arquivo Histórico, pode colmatar esta lacuna e ao mesmo tempo funcionar como estimulo para a elaboração de mais actividades extracurriculares, completando o trabalho efectuado nas sala de aulas e aumentando o nível de conhecimentos e de saber sobre a própria comunidade.»


sexta-feira, junho 08, 2007

Investir na leitura, é dar formação ao povo...

No Egipto, as bibliotecas eram chamadas “Tesouro dos remédios da alma”. A importância dada à leitura era, para os egípcios, algo de muito precioso na formação intelectual e social do seu povo.
Ao reflectirmos sobre as políticas que têm sido implementadas no nosso país, facilmente chegamos à triste conclusão que não será fácil afastarmo-nos do pódio dos países europeus com menores índices de leitura.
Segundo a APEL – Associação Portuguesa de Editores e Livreiros, editam-se por mês mil livros, sendo na sua maioria edições de autores ou de instituições que sequer chegam ao mercado do livro.
Ao sermos artífices da escrita e também, por vezes, editor das nossas próprias obras, julgamos que tudo isto se deve à difícil acessibilidade por parte dos escritores menos mediáticos ao obscuro e até, por vezes, pantanoso circuito editorial.
Para o mercado, é mais vendável um livro da chamada literatura “cor de rosa”, do que um livro de poesia ou um ensaio sobre história local. Ou seja, é preferível encher os escaparates com “livros ocos” das vedetas do Big-Brother, ou da Quinta das Celebridades, do que pôr à disposição dos leitores obras de utilidade para a sua formação.
Este conceito leva-nos ao pensamento do filósofo alemão Friedrick Nietzsche que a respeito da importância dos livros, dizia: “Os leitores extraem dos livros, consoante o seu carácter, a exemplo da abelha ou da aranha que, do suco das flores retiram, uma o mel, a outra o veneno”.
O incentivo à leitura, passa por um permanente investimento na preservação das próprias raízes históricas e na restruturação dos conceitos de políticas de apoios, não se esquecendo os mais jovens leitores.
A urgente existência de bibliotecas em todas as escolas do ensino primário, onde para além dos autores portugueses curriculares, deveriam também ter um espaço destinado às obras de cariz local, importante fonte de cultura e saber.
Nesta última vertente, é digno o contributo de algumas autarquias – caso do nosso município – que mesmo sendo vítimas de cortes na “Lei das Finanças Locais”, têm desempenhado uma importante contribuição à leitura e à divulgação de novos valores, com o apoio e edição de obras de autores locais.
Creiam caros leitores, que ler é fazer amigos, rodearmo-nos de pessoas fascinantes, a quem se tem acesso sem bater à porta; bastando apenas que voltar uma página e emergir no imaginário mundo da escrita e quem sabe se a partir desse momento, não iniciamos uma nova era na nossa vida.

Artur Vaz
Escritor e jornalista almadense

(Crónica publicada no semanário
"Notícias de Almada")

quinta-feira, abril 19, 2007

Cantarei, sempre Abril

Eu cantarei,
ao Portugal
libertado.
Eu canto, ao Abril
por nós conquistado.

Eu canto
aos cravos vermelhos
e à madrugada.
Eu cantarei
à Liberdade
e à vitória
alcançada.

Eu cantarei
aos homens
e às mulheres
que por Abril, tombaram.
Eu canto,
à força
e à razão
das lutas encetadas.

Eu cantarei, Abril,
sempre Abril, será canção.


Artur Vaz






(em Index Poesis, colectânea de poesia
organizada por Ermelinda Toscano.
Edição O Farol / SCALA.
Almada, Outubro 2006)

terça-feira, abril 03, 2007

Um dia com Cesariny...

Morreu o poeta-pintor Mário Cesariny.
Estarrecemo-nos. Sentimos um baque paralisante…
A notícia apanhou-nos de surpresa, muito embora soubéssemos que o seu estado de saúde se vinha a agravar-se, resultado de doença oncológica, que há muitos anos padecia.
Figura sempre inquieta e questionadora, Cesariny foi um dos mais vincados dinamizadores da prática surrealista em Portugal. Integrando o Grupo Surrealista de Lisboa, em 1947, Mário Cesariny foi uma das muitas personalidades da qual fizemos investigação oral, quando preparávamos o livro “Natália Correia – Escritora do Amor e da Liberdade”.
Recebidos na sua casa em Lisboa, Rua Basílio Teles, no dia 10 de Novembro de 2002, pudemos contactar com alguém que, para nós, era somente um referência impar cultural, através da sua poesia e da pintura.
Quantas vezes, o vimos a passear pelo paredão da Costa de Caparica e ficámos sem coragem para abordá-lo, pois a nossa timidez era bem mais forte.
Contudo, a razão e motivo de escrever sobre Natália Correia aguçou-nos os impulsos, marcando um encontro, o qual viria a colmatar algo que há muito desejávamos, privar de perto com alguém que era, acima de tudo, um sonhador e um génio.
Recebidos por si e por sua irmã Henriette, falou-nos da sua formação artística, incluindo o curso da Escola de Artes Decorativas António Arroio e os seus estudos na área de música, com Fernando Lopes Graça. Mais tarde, viria a frequentar a Academia de La Grande Chaumiè-re, em Paris, cidade onde viria a conhecer André Breton, responsável pela sua paixão e amor pelo surrealismo.
Considerando que «O Homem só será livre quando tiver destruído toda e qualquer espécie de ditadura religioso-política ou político-religiosa e quando for capaz de existir sem limites», Mário Cesariny proclamava-se de uma forma activa e profunda «capitão da sua própria alma».
Questionado sobre Natália Correia testemunhou-nos que «...conhecia-a numa ida ao Teatro de São Carlos. Confesso que fiquei perplexo perante a sua beleza. A sensualidade dos lábios e o olhar encantou-me, direi mesmo que estava perante uma estátua de mármore, como lhe chamavam quando queriam definir o seu perfil de mulher fascinante». Como recordo a sua ternura quando falava da amizade que com ela partilhou «não pertencendo ao movimento surrealista, ela própria viria a ser influenciada na sua obra poética», diria Cesariny realçando principalmente esse facto nos primeiros livros de Natália.
Recordando os serões culturais na casa da escritora, Mário Cesariny desvendou-nos que foi numa dessas tertúlias que foi lançado, em 1955, o seu livro de poesia “Manual de Prestidigitação”.
Possuidor de uma personalidade muito forte o fascínio do artista encantou-nos, fazendo com que aquele memorável encontro ficasse para nós registado com algo de muito profundo. No dia seguinte, enviamos por carta o seu depoimento, de modo a que o mesmo fosse por si revisto, antes de ser publicado. Dias depois, Cesariny telefona-nos dizendo: «Que muito grato ficaria, se fosse divulgado o teor do nosso encontro, só depois da sua morte…».
Perplexos ficámos perante tal pedido, mas respeitámos o seu desejo, razão pela qual surge este apontamento.
Morreu Mário Cesariny de Vasconcelos – o homem fechou os olhos ao mundo, mas o mundo não mais fechará os olhos à obra que nos legou.

ARTUR VAZ