sexta-feira, outubro 22, 2010

Fragmentos da infância


Viço da infância
Destituía a maioridade
Na leveza das consciências
Cegava a realidade

Ansiosos do futuro
Mergulhavam os puros
Sonhando com albores da vida
Transformavam suas idas

Desprovidos da sensualidade
Conhecimento era curiosidade
Música, intenso prazer
Como era sedutor aprender!


Eloisa Menezes Pereira
Debaixo do Bulcão poezine
Número 38 - Almada, Setembro 2010
(ilustração de André Antunes)

segunda-feira, outubro 18, 2010

intervalos de escuridão e luz


o q é a angústia?

o q é uma fachada?

é uma porta aberta

e uma fechada

intervalos de escuridão

e luz

barreiras

atalhos

passagens secretas

das correctas para as incorrectas

seguindo as setas

tantas vezes de mão dadas

ou solitários como poetas

fazendo as perguntas certas

e escolhendo as respostas erradas

o q é a angústia?



Carolina Rodrigues
Debaixo do Bulcão poezine
Número 38 - Almada, Setembro 2010

quinta-feira, outubro 14, 2010

Corpos


Encontro no teu ventre
O sonho de me perder
E nos teus lábios
Acordo todas as madrugadas

Descendo pela tua pela
E pelo teu corpo
Entendo como se levanta
O vulcão do teu prazer

Rasgo a fúria
De me fechares nas tuas pernas
Enquanto brota de dentro de ti
O rio que leva o néctar
À floresta das túlipas

Somos amantes das cavernas
E das trompas que tocam
Num rufar de pernas e abraços
Deitados no chão das montanhas

Quero possuir-te na concha dos deuses
Em espaços para não adiar o amor
Inventando lugar de encanto
Em camas de todos os prazeres


Victor Serra
2/2/2010


Debaixo do Bulcão poezine
Número 38 - Almada, Setembro 2010

segunda-feira, outubro 11, 2010

Anjos, Lx



caras
línguas que não conheço
só reconheço os olhares
que são universais
alguns cheiros mas nem todos
alguns são demasiado internacionais

um homem cambaleia
tropeçando na sua vida e na sua morte
à sua sorte

duas cores
trocam palavras
trocam favores
experimentam-se sabores

aqui
eu não sou ninguém
sou uma raça
sou uma branca
alguém
todos andam agrupados
pouco misturados

quando se juntam
é para trocar
comprar
vender
estas três coisas
estão sempre a acontecer
do amanhecer
ao anoitecer
numa loja
numa esquina
uma troca tem de ocorrer
numa zona de vício
de miséria
o dia não acaba
o corpo não acalma
há uma sede de abandono
ao que nos deixa
completos e dormentes
mesmo que cada vez mais
incompletos e infelizes

o meu cérebro paira
entre a palavra e a cor

como um trovador
canto
e conto
estas histórias que vejo
nesta vida que tenho percorrido

guardo frases
que não serão repetidas



Carolina Rodrigues

Debaixo do Bulcão poezine
Número 38 - Almada, Setembro 2010

sábado, outubro 09, 2010

Uma homenagem a John Lennon (9 outubro 1940 - 8 dezembro 1980)

"A Day in The Life", um dos grandes poemas que Lennon compôs para os Beatles.

quinta-feira, outubro 07, 2010

Superação



Cerrou-se o portal
Com uma pálida luz
Pensamento mortal
Minha sina, minha cruz.

Na cegueira repentina
Da pupila solitária
Sem lume na retina
Negligente luminária.

Embaraçou o nervo secreto
Sem ilusão de ótica
Da luz, um furto discreto
Na ação caótica.

No reflexo cambiante
Eis uma cena difusa
No meu passo hesitante
Muito mais confusa.

Como cruel navalha
Dilacerou minha segurança
Ergueu-se uma muralha
Dissipou minha esperança.

Sem estímulo luminoso
Orei por um indulto
E o pedido silencioso
Não quero apenas um vulto.

Cintilantes lantejoulas
Já avisto sem luneta
Sem o ópio das papoulas
Exalto a cura em opreta.


Mônica Quinderé



Debaixo do Bulcão poezine
Número 38 - Almada, Setembro 2010

(Paginação de André Antunes)

segunda-feira, outubro 04, 2010

O medo


Noite de jangadas e de medos
Tempo que resta para encontros
Enquanto o silêncio se apodera
Do que inventamos nos jornais

Como se o tempo da outra senhora
Voltasse tranquilamente alienando
As memórias de já não sentirmos nada
Do que nos cala... e vamos consentindo

Mas nada nos calará a revolta
Que trazemos nas palavras
Nem somos acomodados do deixa andar
E sabemos... quem nos empurra para o abismo

Victor Serra
24-11-2009


Debaixo do Bulcão poezine
Número 38 - Almada, Setembro 2010

(Ilustração de André Antunes)

domingo, outubro 03, 2010

Construção


Esculpi
na pedra bruta,
o meu sentir e a minha alma.
Por entre as colunas do templo,
voam os meus afectos e sentimentos.

Lentamente, mas segura da razão
a obra nasce em consciência...

Caminho de olhos bem abertos,
a obra nasce em consciência...

Caminho de olhos bem abertos,
apoiado um bordão de acácia
em direcção ao Supremo.
De cabeça erguida,
enfrento ventos e silêncios.

Tudo é perfeito...
o aroma das rosas aguça-me.
No céu, entre astros
realça a estrela d'Alva.

A essência e o profano
transporta o astro-rei.
A obra floresce, a pedra está polida.


Artur Vaz


Debaixo do Bulcão poezine
Número 38 - Almada, Setembro 2010