quarta-feira, julho 30, 2008

Que céu interurbano!


eu sei que a esta hora (são quatro como se diz da manhã)
não deveria comer feijão. mas estou autenticamente com fome
(antes deveria dizer verdadeiramente) e por isso
abro uma lata de feijão que como
(não a lata o feijão) às colheradas.
depois vou à janela fumar um cigarro e é então
que noto como se fosse a primeira vez (e é) que o vejo
o horizonte de edifícios sobrepondo-se ao horizonte
de edifícios que por sua vez se sobrepõe
ao horizonte de edifícios.
na verdade nunca me tinha apercebido disto:
o quão interessante é viver no limiar de uma cidade
e poder daqui observar outra cidade e mais adiante
outra cidade. as formas geométricas monótonas
pela sobreposição deixam de ser monótonas
(mas se as visse amanhã diria o mesmo?)
(melhor mesmo é vê-las também amanhã.)
e crescem (como se crescessem) no horizonte da noite
cidade sobre cidade até quase florear o céu
(que céu interurbano!...)

digo eu...








Debaixo do Bulcão poezine

Número 33 - Almada, Junho 2008

1 comentário:

Debaixo do Bulcão disse...

Obs:

1 - Neste poema, a palavra "deveria" aparece como uma reminsicência de algumas situações dos (meus) anos 90 - e é por isso mesmo que está em itálico. Um dia destes talvez eu vos explique...

2 - Com este poema e com os de Madalena Barranco e BB Pásion fica completa - por agora - a divulgação da edição 33 do Debaixo do Bulcão poezine. Os textos que faltam (um poema de amor, de Alexandre Castanheira, e um poema de Luís Milheiro sobre o movimento cultural alternativo de Almada nos anos 90, bem como um comentário meu a esse poema) ficam guardados para outra oportunidade.

3 - O próximo Debaixo do Bulcão (edição impressa) sai no início do Outono (finais de Setembro ou em Outubro). Podem começar já a preparar os vossos textos. (A "gerência" agradece).

António Vitorino