terça-feira, abril 14, 2009

O Silêncio de que fala Zé


Tudo começou por uma grande paixão pelas ilhas, a quem começámos a chamar “nossas”.
A história que vos vou contar passa-se em duas ilhas, longe daqui, longe, muito longe.
O tempo estava óptimo. Mais chuvinha, menos chuvinha, mas isso é normal.
Eu adoro andar de avião, não só pela sensação de ir, mas também pelas óptimas refeições servidas a bordo. Mas o melhor desta viagem não foi isso.
Lá há água, água, água. Para além do silêncio, é o que há lá mais. Tudo é bonito quando lá estamos e conseguimos sentir os pequenos pingos de água a caírem na nossa cabeça. Tudo se torna menos bonito quando nos lembramos que cá estamos a poupar cada pinga dessas.
As encostas, de onde cai essa água, metem respeito. Grande não é o maior homem do mundo. Grandes são aqueles montes polidos pela chuva.
Vaquinhas, vaquinhas, vaquinhas. Gostava de ser como elas. Ficar sentada a olhar...apenas a olhar...precisar apenas de erva para comer, daquele ar puro para respirar, e daquele barulho do silêncio para ouvir. Para quê o frenesim dos dias, a pressa de chegar ao emprego, o barulho dos carros, as idas ao supermercado, o dar de comer ao cão, de matar a cabeça com coisas sem importância? Para quê? Lá é assim, lá não há complicações, não há!
Agora que cá estou, tudo voltou o “normal” dos dias. Chegada de novo a casa. Lágrimas foram mandadas pelos ouvidos, ao ouvirem de novo o barulho do barulho.

Gostava de conseguir ouvir esse silêncio que lá se faz, aqui (de alguma forma parar o processo). Ainda consigo sentir o cheiro a erva, o ar limpo, as gotas de água, os pés molhados, o balançar do mar e o silêncio das montanhas. Mas o melhor desta viagem foi mesmo descobrir, finalmente, o silêncio de que fala Zé, Tal como som do silêncio de uma ventania, o som que se encerra na barriga de um gato que dorme, o som de uma lagarta que se transforma, de uma semente que germina, de um abraço eterno, o som das montanhas que falam umas com as outras.
Sim Zé, a vida é mesmo bonita...lá, lá é bonita sim.





Debaixo do Bulcão poezine
Número 35 - Almada, Março 2009
(foto da autora)

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