Como eras
A quem não disse
Eras como os brincados
que fazia
na praia da minha enseada
Eras como meu delírio
dar ao vento papagaio
todo feito de papel
Eras como a cana
a linha
o anzol
nas tarde d’outrora
Eras como o que sonhava
quando só o mar sorria
aos sorrisos dos meus lábios
Eras como ontem do meu hoje
que trazia como te trago
no fundo-ser vivificado
morno povoado de casas simples.
Tacalhe
Empresários
máquinas cortando atalhos
rasgando tubos
troncos caindo ao som dos galhos
cobrindo áreas
barracos com pernas mansas
pelos ares
balseiros carregando planos
virando areia
represa fácil de água muita
comendo terras
em presa moto no tronco grosso
vencendo serras
empresários tomam mares de whisky
bem frios calados estouram lares
para o gado engordar
empresam rios
na cidade a carne humana
pele e osso
Clodomir Monteiro
Poesia de um tempo em que não se publicava mais “por falta de papel”!...
Estes poemas estão incluídos na edição número 2 da revista “Raizes”, publicada em Abril de 1977, na Cidade da Praia, pela Imprensa Nacional (de Cabo Verde, obviamente).
Por se tratar do único número que possuo desta revista, não posso adiantar muita informação. O que sei, e vos transmito, é o que está na ficha técnica da publicação:
Director, Arnaldo França; Administrador, Orlando Mascarenhas; textos de Dulce Almada Duarte, H. de Santa Rita Vieira (ensaios); Teixeira de Sousa, Maria Margarida Mascarenhas, Arménio Vieira (prosa de ficção); Jorge Barbosa, Oliveira Barros, Ovídio Martins, Jorge Carlos Fonseca, Arménio Vieira, Tacalhe, Helder Proença, Clodomir Monteiro, Luis Romano (poesia); Félix Monteiro, Osvaldo Osório, Arménio Vieira (crítica).
Interessante é também o editorial (não assinado):
«Não cumprida a promessa de periodicidade trimestral logo ao segundo número, sentimo-nos, porém, compensados de quantas frustrações passadas por não terem sido nem a falta de resposta dos intelectuais caboverdeanos ao nosso apelo nem a ausência de leitores que, ao contrário, obrigaram ao aumento da tiragem, os responsáveis por esta demora. Razões de natureza técnica assentes principalmente na extrema dificuldade de obtenção de papel, adiaram o aparecimento deste número.
(...)
Esperamos que os leitores e colaboradores compreendam as dificuldades inevitáveis com que lutamos e de que o aspecto gráfico destes números é tão significativo testemunho, mas que a breve trecho procuraremos superar.»
A quem não disse
Eras como os brincados
que fazia
na praia da minha enseada
Eras como meu delírio
dar ao vento papagaio
todo feito de papel
Eras como a cana
a linha
o anzol
nas tarde d’outrora
Eras como o que sonhava
quando só o mar sorria
aos sorrisos dos meus lábios
Eras como ontem do meu hoje
que trazia como te trago
no fundo-ser vivificado
morno povoado de casas simples.
Tacalhe
Empresários
máquinas cortando atalhos
rasgando tubos
troncos caindo ao som dos galhos
cobrindo áreas
barracos com pernas mansas
pelos ares
balseiros carregando planos
virando areia
represa fácil de água muita
comendo terras
em presa moto no tronco grosso
vencendo serras
empresários tomam mares de whisky
bem frios calados estouram lares
para o gado engordar
empresam rios
na cidade a carne humana
pele e osso
Clodomir Monteiro
Poesia de um tempo em que não se publicava mais “por falta de papel”!...
Estes poemas estão incluídos na edição número 2 da revista “Raizes”, publicada em Abril de 1977, na Cidade da Praia, pela Imprensa Nacional (de Cabo Verde, obviamente).
Por se tratar do único número que possuo desta revista, não posso adiantar muita informação. O que sei, e vos transmito, é o que está na ficha técnica da publicação:
Director, Arnaldo França; Administrador, Orlando Mascarenhas; textos de Dulce Almada Duarte, H. de Santa Rita Vieira (ensaios); Teixeira de Sousa, Maria Margarida Mascarenhas, Arménio Vieira (prosa de ficção); Jorge Barbosa, Oliveira Barros, Ovídio Martins, Jorge Carlos Fonseca, Arménio Vieira, Tacalhe, Helder Proença, Clodomir Monteiro, Luis Romano (poesia); Félix Monteiro, Osvaldo Osório, Arménio Vieira (crítica).
Interessante é também o editorial (não assinado):
«Não cumprida a promessa de periodicidade trimestral logo ao segundo número, sentimo-nos, porém, compensados de quantas frustrações passadas por não terem sido nem a falta de resposta dos intelectuais caboverdeanos ao nosso apelo nem a ausência de leitores que, ao contrário, obrigaram ao aumento da tiragem, os responsáveis por esta demora. Razões de natureza técnica assentes principalmente na extrema dificuldade de obtenção de papel, adiaram o aparecimento deste número.
(...)
Esperamos que os leitores e colaboradores compreendam as dificuldades inevitáveis com que lutamos e de que o aspecto gráfico destes números é tão significativo testemunho, mas que a breve trecho procuraremos superar.»
2 comentários:
António, Tacalhe fala de um paraíso perdido, enquanto que Clodomiro dá os ossos da realidade. E quanto a "Raízes", António, tens uma preciosidade nas mãos - do tempo em que a poesia se fazia mesmo sem papel - isso dá um bom livro! Beijos. P.S. muito obrigada pela sua visita ao Letras de Morango e também à minha coluna, adooorei seu incentivo!
Madalena (e todos os leitores deste blogue): por falar em preciosidades, espere(m) só até eu trazer aqui alguns poemas do século XIX. A sério: encontrei uma colecção de jornais da década de 70 (ou 80, não os tenho agora aqui comigo), e espero começar a divulgá-los em breve.
António Vitorino
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